sábado, 31 de julho de 2010

TJRN reconhece união homoafetiva

O Tribunal de Justiça reconheceu, pela primeira vez no Estado do Rio Grande do Norte, uma união homoafetiva, ocorrida no período compreendido entre o ano de 1990 a 2003, mantida entre duas mulheres, para que seja equiparada ao status de união estável. O acórdão é da 3ª Câmara Cível, que reformulou a sentença de 1º grau e decretou a dissolução da união e determinou a partilha igualitária dos bens adquiridos no período de convivência entre as partes.

A autora da ação na 6ª Vara Cível de Natal (N.R.S.) informou que manteve um relacionamento amoroso homossexual com S.T., no período compreendido entre abril de 1990 a abril de 2003, perfazendo um total de 13 anos, e que, na constância do relacionamento, construíram um patrimônio considerável, uma vez que exploravam a atividade comercial de transporte alternativo na Linha 402 – Ponta Negra/Alecrim. Ao final, requereu o reconhecimento e dissolução da união, com a consequente partilha do patrimônio distribuído em comum.

Ao analisar o caso, o juízo de 1º grau julgou parcialmente procedente o pedido formulado nos autos, para reconhecer a união como sendo uma sociedade de fato existente entre as partes, no período de abril de 1990 a abril de 2003, bem como decretar a sua dissolução. O juízo revogou o instrumento público de mandato em que a autora N.RS. outorga poderes para S.T. administrar seus bens.

A sentença também condenou S.T. a pagar a autora o percentual de 40% sobre o valor correspondente ao veículo Sprinter, à motocicleta Yamaha S. Tener, bem como à Permissão de exploração de transporte opcional contraída em seu nome (Concorrência Pública Nº 002/98), a ser apurada em liquidação de sentença.

A outra parte, S.T., pediu pela improcedência dos pedidos autorais ou, alternativamente, julgá-lo parcialmente procedente, apenas para reconhecer e dissolver uma sociedade de fato havida entre as partes da qual não existem bens a partilhar, ou, ainda, que seja reduzida a porcentagem determinada pelo Juízo de 40% na divisão sobre os bens elencados na sentença.

O relator do recurso, desembargador Amaury Moura, reformou a sentença no tocante não só a equiparação da união homoafetiva a união estável, mas também determinando que os bens adquiridos pelos conviventes devem ser partilhados igualitariamente, a título oneroso, na constância da união estável, evitando-se o enriquecimento de uma parte em detrimento da outra.

Fonte: TNonline

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Para Ajufe, Supremo é um tribunal de advogados

“Causa-nos preocupação quando olhamos a foto da atual composição do Supremo Tribunal Federal e percebemos que há apenas um juiz de carreira”. A frase é do presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Gabriel Wedy, para justificar os motivos de a entidade estar em campanha para que o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, escolha um juiz federal para a vaga do ministro Eros Grau, que se aposenta até o dia 19 de agosto.

Wedy não mede as palavras. Para ele, é “nefasto para a República” que se abra mão da experiência de juízes federais no STF. “Claro que temos grandes ministros vindos da OAB e do Ministério Público, mas a experiência do magistrado de carreira é fundamental. É triste que não tenhamos representatividade de juízes de carreira no Supremo. Que ele seja composto, em sua ampla maioria, por advogados. Um tribunal de advogados”, fala em tom de denúncia.

São cinco os ministros do Supremo que exerceram a advocacia por razoáveis períodos antes de se tornarem juízes: Carlos Britto, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Eros Grau e Ricardo Lewandowski. O ministro Lewandowski, advogou por 16 anos, mas foi desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo por outros 16 anos antes de assumir o posto no STF.

A ministra Ellen Gracie e o ministro Marco Aurélio também exerceram a advocacia no início de suas carreiras, mas logo integraram as fileiras do Ministério Público, de onde foram alçados a postos de juízes em tribunais colegiados por meio do quinto constitucional.

Ellen foi juíza do Tribunal Regional Federal da 4ª Região por 11 anos. Marco Aurélio julgou por três anos no Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região e compôs o Tribunal Superior do Trabalho por nove anos. Outros três ministros são oriundos do serviço público ou do Ministério Público. O atual presidente, ministro Cezar Peluso, é juiz de carreira, mas da Justiça estadual.

O presidente da Ajufe admite que o Supremo não é menos qualificado por não ter juízes federais em sua composição, mas diz que a falta de magistrados federais torna a Corte “menos democrática e menos plural”. Wedy reconhece que a bagagem jurídica dos atuais ministros que compõem o STF é “inquestionável”, mas isso não basta, em sua opinião.

“Quando nós transformamos um tribunal em um tribunal da OAB, será que a população está segura?”, questiona. “Soa estranho que o tribunal máximo do país seja composto por juízes que ao longo de suas vidas não foram juízes. Foram advogados ou representantes do Ministério Público”, afirma o presidente da Ajufe.

Diante dos argumentos do presidente da Ajufe, coloca-se a questão: não é melhor que se escolham os ministros do Supremo por seu notório saber jurídico e não porque representam essa ou aquela categoria? Wedy, então, defende a campanha de sua associação: “Isso não é uma ação corporativa, mas sim em benefício da sociedade. Nos últimos tempos tivemos decisões paradigmáticas, sejam no âmbito do tráfico de drogas, sejam na condenação de líderes do PCC, todas tomadas por juízes federais”.

Lista sêxtupla
A Ajufe pretende entregar nas próximas semanas ao presidente Lula os currículos dos seis juízes que foram escolhidos por seus pares para integrar o Supremo como representantes dos juízes federais. A lista com os nomes escolhidos foi encaminhada por ofício na semana passada. São eles: Fausto Martin De Sanctis, Leomar Barros Amorim de Sousa, Odilon de Oliveira, Reynaldo Soares da Fonseca, Ricardo César Mandarino Barreto e o ministro do STJ Teori Albino Zavascki.

A lista foi entregue em ordem alfabética, para não privilegiar ninguém. Votaram na pesquisa 1.008 juizes federais - segundo dados do CNJ, os magistrados federais de primeira e segunda instância eram 1.212, em 2008. Odilon de Oliveira e Fausto de Sanctis, dois juízes com forte presença na mídia, foram os mais votados: tiveram 67 e 62 votos respectivamente. Segundo o presidente da Ajufe, a eleição foi direta, sem a interferência da entidade.

É a segunda vez que a Ajufe promove uma consulta deste gênero. A primeira foi feita sob a presidência do juiz federal Jorge Maurique, em 2006, e o mais votado foi o juiz Vladimir Passos de Freitas, hoje aposentado e colunista da ConJur. Lula nomeou, na ocasião, o ministro Ricardo Lewandowski.

Fonte: Conjur

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Juíza argentina se nega a casar gays mesmo que "custe sua própria vida"

Uma juíza de paz argentina afirmou nesta sexta-feira que jamais realizará o casamento de casais homossexuais, um dia depois de o Senado aprovar uma lei que autoriza essas uniões.

"Que me acusem do que quiser. Deus me diz uma coisa e eu vou obedecer com todo rigor, mesmo que custe meu cargo, e mesmo que me custe a vida", afirmou Marta Covella, juíza de paz da cidade de General Pico.

"Fui criada lendo a Bíblia e sei o que Deus pensa. Deus ama a todos, mas não aprova as coisas ruins que as pessoas fazem. E uma relação entre homossexuais é uma coisa ruim diante dos olhos de Deus", assinalou ainda.

A Argentina se converteu na madrugada de quinta-feira no primeiro país da América Latina a autorizar o casamento entre homossexuais, com uma histórica e longa votação no Senado.

A lei foi aprovada com 33 votos a favor, 27 contra e 3 abstenções, depois de uma sessão que durou mais de 14 horas e apesar da oposição da Igreja católica, que liderou uma intensa mobilização social para impedir a aprovação do projeto.

A nova legislação propõe reformar o Código Civil mudando a fórmula de "marido e mulher" pelo termo "contraentes" e prevê igualar os direitos dos casais homossexuais com os dos heterossexuais, incluindo os direitos de adoção, herança e benefícios sociais.

A Igreja lançou na última semana uma forte ofensiva contra a lei e mobilizou na terça-feira milhares de seus fieis para pressionar contra sua aprovação.

Fonte: Folha.com

sábado, 3 de julho de 2010

Estupradores usam nova lei para reduzir tempo na prisão (!)

Luiz Flávio Gomes - 29/06/2010

No dia 15 de junho de 2010 a “Folha de S. Paulo” (p. C1), seguindo o estereotipado estilo do populismo penal, deu esta manchete: “Estupradores usam nova lei para reduzir tempo na prisão”. Em seguida se lia: “Lei uniu crimes de atentado violento ao pudor e estupro, permitindo responder por apenas um deles. Já há vários casos de redução de pena pelo país; é tragédia jurídica, dizem promotores e membros do Judiciário”.

A deputada Maria do Rosário (PT-RS), relatora da lei, disse que a interpretação dos juízes está errada. “Se a pessoa pratica só conjunção carnal, ela vai ter pena de reclusão de seis anos. Se ela pratica coito anal, relação sexual oral, vários coitos, várias conjunções, a pena é a mesma. Isso acaba servindo de estímulo” (juiz Ulysses de Oliveira Gonçalves Júnior). No dia seguinte —e isso é a glória do jornalismo engajado com o populismo pena—, sua repercussão é imediata: “Senado avalia mudar nova lei do estupro”.

Quando a mídia dramatiza, espetaculariza, o parlamento imediatamente ecoa. O legislador, que perdeu completamente sua autoridade, em virtude do seu envolvimento com tantas falcatruas, nepotismos, patrimonialismos etc., já não consegue reagir de forma racional e independente. Seu discurso se apresenta, quase sempre, como apêndice da mídia. Essa é uma das partes mais visíveis da engrenagem do populismo penal.

A questão polêmica é a seguinte: o sujeito, no mesmo contexto fático, constrange a mesma vítima (uma mulher), mediante violência ou grave ameaça, e mantém com ela tanto conjunção carnal como coito anal. Esse “fato”, esse contexto fático único contra a mesma vítima, constitui crime único (CP, artigo 213, com a redação dada pela Lei 12.015/2009) ou uma pluralidade de crimes (concurso de crimes)?

Antes do advento da Lei 12.015/2009, os fatos narrados estavam previstos em dois tipos penais: artigo 213 (conjunção carnal) e artigo 214 do CP (coito anal, ou seja, ato libidinoso diverso da conjunção carnal). A jurisprudência majoritária entendia haver nesse caso concurso materialde crimes (JSTF 301/461), isto é, dois crimes autônomos e independentes, com penas somadas. Não se tratava de conduta única, logo, impossível era reconhecer o concurso formal. Mais: considerando-se que os dois delitos achavam-se em tipos penais distintos, impossível era (também) reconhecer o crime continuado. Assim era antes da Lei 12.015/2009.

O STJ, nos HCs 104.724-MS e 78.667-SP, Quinta Turma, dia 22 de junho de 2010, seguiu esse antigo entendimento: não se trata de crime único. Haveria, para essa Turma (votos condutores de Felix Fischer e Laurita Vaz), uma pluralidade de crimes (concurso material). E mais: considerando-se que se trata de “penetração sexual” distinta, nem sequer cabível seria o crime continuado. Fundamento dessa posição: “o novo crime de estupro é um tipo misto cumulativo.

O decidido pelo STJ (em 22.06.10) diverge do entendimento já aceito pelo STF, que sinalizou a aprovação da tese do crime único (HC 86.110-SP, rel. Min. Peluso). Nesse mesmo sentido: STJ, Sexta Turma, HC 144.870-DF, rel. Min. Og Fernandes, julgado em 9/2/2010.

O tipo penal do artigo 213, para nós, é um tipo penal composto ou misto ou de conteúdo múltiplo ou de conteúdo variado porque descreve várias ações. Tipo penal misto alternativo ou cumulativo?

Para Diego-Manuel Luzón Peña (Curso de Derecho penal, Universitas)o fator distintivo entre tais conceitos passa por saber se a segunda (ou outra) conduta agrega ou não maior desvalor ao fato. No caso do delito de tráfico de drogas (artigo 33 da Lei 11.343/2006), se o sujeito importa a droga e a mantém em depósito e depois transporta, em nada se altera o injusto —não existe maior desvalor da conduta ou do resultado. Cuida-se de um tipo penal misto alternativo. Quando a segunda conduta implica em maior desvalor do fato, o tipo penal seria misto cumulativo.

O critério dado por Luzón Peña nos parece válido, mas incompleto, porque para além do maior desvalor do fato há outros dados muito relevantes: saber se se trata do mesmo contexto fático ou não, da mesma vítima ou não, do mesmo bem jurídico ou não.

No caso do artigo 213 do CP, se o sujeito pratica coito vaginal e coito anal, contra a mesma vítima, no mesmo contexto fático, isso significa maior desvalor do fato? Para nós a resposta é positiva, claro que sim. Então o artigo 213 retrataria um tipo penal misto cumulativo? Sim.

Unitário ou concursal? Unitário. Por quê? Porque se trata de contexto fático único contra a mesma vítima. Contexto fático único, mesma vítima e mesmo bem jurídico, embora ofendido de diversas formas, jamais pode configurar uma pluralidade de delitos. Cuida-se de crime único. Mas a pluralidade de condutas e de ofensas valeriam para algo? Sim, para a dosagem da pena, nos termos do artigo 59 do Código Penal. O estupro com coito vaginal e anal, em razão do maior desvalor do fato, evidentemente tem que ser punido de forma mais grave que o estupro com coito vaginal tão-somente.

A Quinta Turma do STJ, nos HCs 104.724-MS e 78.667-SP, acertou —de acordo com a classificação dada por Luzón Peña: maior desvalor do fato quando várias condutas são realizadas— ao admitir a existência no artigo 213 do CP de um tipo penal misto cumulativo. Equivocou-se, no entanto, ao concluir pelo concurso material de crimes). Equivocou-se mais ainda ao refutar o crime continuado, com base na teoria da “penetração sexual”.

O legislador da Lei 12.015/2009 atirou no que viu e acertou no que não viu. Ele queria punir mais gravemente o estupro e o atentado violento ao pudor. Imaginou que fundindo os dois tipos penais (artigos 213 e 214 do CP) isso seria alcançado. Errou no seu propósito. Mas acertou em fundir os dois tipos penais.

Cabe agora aos intérpretes e aplicadores da lei distinguirem o joio do trigo, ou seja, as situações concretas. Quando se trata do mesmo contexto fático, mesma vítima e mesmo bem jurídico, ainda que o sujeito realize várias ações, não há como deixar de reconhecer crime único (punido mais severamente). Considerando-se as várias ações (maior desvalor do fato), a ele (juiz) compete fazer a adequação da pena, atendendo à seguinte equação: maior desvalor do fato = maior pena.